INDEPENDÊNCIA 1984
Na versão de 1984 S.P a B.H. já se
corria e disputava em 3 categorias. A princípio, graduados,
novatos e estreantes, mas ainda em duplas.
Neste ano eu já era piloto da categoria
novatos e meu filho, Mário Júnior tinha completado
18 anos e foi meu parceiro. Nesta prova aconteceu uma coisa inédita:
cada piloto largava de um local diferente, no mesmo dia e na mesma
hora e ia encontrar no 1.º Neutralizado.
Eu larguei de Parati e meu filho largou de Angra
dos Reis, encontramos em Guaratinguetá e daí prosseguimos
juntos.
Bom, agora vou contar certos acontecimentos engraçados:
" Fomos primeiro para Parati eu, meu irmão Eustáquio
e seu amigo mecânico ( de auto ) e meu filho Mário
Júnior. Fomos de carro, e um reboque com as duas motos XLL
- 250 Honda ano -83, na bagagem meu filho acrescentou um tanque
de plástico. Chegamos em Parati já escurecendo. Fomos
para o hotel que foi previamente reservado, onde encontrei com o
Dalton, meu sobrinho que residia em Lavras e que era piloto; que
gostava mais de Motocross, mas fazia algumas provas de Enduro e,
neste ano, foi correr no Independência. Então eu e
o Dalton ficamos no Hotel em Parati e, lá pela meia noite,
quando o Júnior terminou de colocar o tal tanque de plástico
na moto, rumou para Angra com meu irmão, o mecânico
e o parceiro do Dalton, quem não lembro mais o nome.
Fui dormir, entrei no quarto e o Dalton estava
dormindo, fui ao banheiro, escovei os dentes, coloquei o pijama
e deitei, mas não conseguia dormir, apesar do cansaço,
pois o Dalton roncava numa altura
que parecia que seu ronco estava amplificado. Tentei
de tudo, assobiava, empurrava-o e nada, parava um pouquinho de roncar
e logo começava de novo, parecia que mais alto ainda. No
quarto ao lado da porta do banheiro, havia encrustado na parede
um vidro de onde se tinha a visão de um pequeno jardim de
inverno. Tive uma idéia, apanhei um jornal que estava ao
chão, abri a porta que dava acesso ao pequeno jardim, desfolhei
o jornal e aticei fogo no mesmo, de modo que através do vidro,
o Dalton podia ver e aproximando-me dele, balancei-o, gritei alto:
_ Dalton, acorda, o hotel está pegando fogo, acorda, acorda,
vamos sair. Ele acordou assustado, sem saber o que estava acontecendo,
levantando da cama apavorado: _ O que foi? O que foi?
Então quando vi que ele estava desperto,
lhe disse: _ " ô bicho " ( expressão muito usada na
época ), este foi o único jeito que eu achei para
te acordar, pois não conseguia dormir com o seu ronco. E
ele: _ Porra, você quase me mata de susto!
Eu tratei logo de deitar e dormir, porque sabia
que cansado e morto de sono dormiria primeiro que ele e, depois
que eu dormisse, ele poderia roncar a vontade, pois meu sono é
pesado. Neste ano choveu bastante à tarde do 1.º dia, o dia
inteiro no 2.º e na noite na véspera do 3.º dia. A prova
estava cansativa, muita lama, rios cheios pra atravessar, me lembro
de um onde o Didi 2 Tempos era P.C. Ao chegar o Didi falou: _ Marão,
cuidado, porque a água está subindo rapidamente, atravesse
logo, senão vocês sobram, se você não
passar por aqui vai ter que voltar e passar numa ponte aí
pra cima. A volta é longa e será difícil achar
o roteiro novamente; Então chamei o meu filho e fomos atravessar,
fora da moto, para diminuir o risco da água entrar pela descarga.
A correnteza era forte, teve hora que achei que não iríamos
conseguir , mas ai fala mais alto a garra , a vontade de vencer
o obstáculo e então você consegue. Quando acabamos
de atravessar, olhei para trás e vi que a dupla que vinha
atrás já não conseguiu passar, pois o volume
de água aumentava com grande rapidez.
Outro fato interessante ocorreu com a corrente
da moto do meu filho, a corrente foi esticando e se soltava, paramos
várias vezes para colocá-la de novo ou esticá-la.
Chegamos em Barbacena a tardinha, final do 1.º dia e já anoitecendo
tivemos a sorte de encontrar ainda aberta uma oficina onde foram
retirados três elos da corrente. O certo seria colocar uma
transmissão nova, mas não tínhamos. No dia
seguinte seguimos para São João Del Rey, onde tivemos
poucas estradinhas e muitas trilhas, estas cansativas pois a chuva
não dava trégua. À noite, saiu o resultado
parcial da prova. Eu já estava com quase certeza que estava
liderando a competição, pois no primeiro dia a maioria
das duplas encarretaram as motos, quando tinham percorrido 2/3 +
ou - da prova e, para minha surpresa, a diferença pro 2.º
lugar era enorme. Nós tínhamos perdido 7 mil e poucos
pontos e o 2.º que era o Aluísio e o Primo que estavam com
12 mil e tantos pontos. Saímos para o 3.º e último
dia de São João Del Rey para Belo Horizonte com Neutro
em Mariana. Aí aconteceu o pior que pode acontecer com uma
dupla numa competição. Já chegando em Mariana,
no deslocamento, a cerca de 2 Km do Neutro principal, me aparece
na contra mão um piloto de Santa Catarina, que levava álcool
para a moto do seu parceiro ( isto mesmo, álcool ). Na época
alguns mecânicos tentaram esta transformação.
Batemos de frente, felizmente machuquei só o pé, mas
dava pra continuar. Levantamos a moto e acertamos a frente, o pedal
de marcha tinha torcido, tinha forma da letra O. Meu filho, com
aquela mão que Deus lhe deu, e a força de um leão,
desentortou o pedal e ficou razoável. Dava tranqüilamente
pra seguir. E assim o fizemos até o Neutro onde meu irmão
e o mecânico nos esperavam. Então enquanto tomava algo
e comia alguma coisa, contei para ambos o acontecido. Foi quando
o mecânico disse: _ Vamos trocar o pedal, aqui tem um novinho
junto com os cabos. Eu disse: _ Não precisa e o tempo é
curto. O rapaz querendo ser gentil: _ Ora, deixa comigo, eu troco
este pedal em 5 minutos. E começou a soltar o pedal e nada.
Inadvertidamente apanhou uma espátula, aquelas de trocar
pneu, e foi forçando o pedal até que o sacou, isto
tudo longe da minha vista. Quando eu e o parceiro acabamos e aprontamos
para a saída, dei uma olhada no acumulado ( relógio
) e disse: _ Faltam 2 minutos para largarmos. Coloquei o capacete,
dei no clique, motor funcionando, despedi-me, coloquei a primeira,
passei pra segunda e a terceira, quem disse que entrava? Tentei
novamente e nada, voltei apavorado, pensando no pior, e o pior tinha
acontecido. Retornei ao ponto de partida, tinha andado só
uns 200 metros. Meu irmão perguntou: _ o que aconteceu? Responde:
_ a 3.ª não entra, e o mecânico com uma cara de desespero
ficou sem saber o que fazer. Então avistei um mecânico
da Motocity, acelerei até ele e disse: - Fulano, por favor,
você pode dar uma olhada, a 3.ª não entra de jeito
nenhum. Ele examinou e disse: _ Você trocou este pedal agora?
Eu disse: afirmativo. _ Bom, disse o mecânico: _ Tenho quase
certeza de que quem trocou este pedal em vez de folga-lo na fenda
para saca-lo, forçou na parede do motor e fez uma alavanca
tal que soltou a ruela que tem no final do eixo dentro da caixa;
por isso só passa a 1.ª e a 2.ª marcha. E pra concertar?
Perguntei-lhe, já sabendo da resposta. De 2 a 3 horas, respondeu
o mecânico. Moço, me bateu um desespero, sentei no
meio fio e chorei, chorei por pelo menos 5 minutos sem parar, mil
pensamentos passavam pela minha cabeça, isto é castigo,
eu não mereço, o que é que fiz, meu Deus, pra
merecer este castigo com a prova ganha? A diferença era de
+ ou - 5.000 pontos. Meu filho tentava me consolar: _ Pai o ano
que vem nós ganhamos, não deu desta vez. E eu respondi
irado: _ não vai ter próxima vez, vou largar esta
merda, não vou mais competir. Levantei-me e fomos encarretar
as motos, não fui na chegada, não fui na entrega dos
troféus. O Aloísio e o Primo ficaram com o 1.º lugar.
É isto ai. Quando a raiva passou e comecei
a raciocinar, vi que tinha falado muita besteira, mas também
lembrei-me e não dirigi uma palavra de desagravo para o mecânico
que era amigo do meu irmão, e só teve boa vontade.
Percebi que é errando que se aprende, pois jamais poderia
ter levado um mecânico de auto para me dar apoio. Era preferível
não levar ninguém, e também se eu não
tivesse levado a peça, teria ganho a prova, mesmo com o pedal
torto. E quem disse que eu parei? Foi expressão de boca pra
fora no momento de desabafo. Assim que a moto foi consertada, lá
estava eu nas trilhas novamente, as quais, algumas, percorro até
hoje."
Marão